Justiça

Justiça e misericórdia, escultura na Cumberland School
Eu sei o que vocês têm feito. Sei que não são nem frios nem quentes. Como gostaria que fossem uma coisa ou outra! Mas, porque são apenas mornos, nem frios nem quentes, vou logo vomitá-los da minha boca. Apocalipse 3.15-16

Essas palavras do visionário João têm incomodados os cristãos através das gerações. Ninguém entre nós quer ficar no meio, ninguém quer ser morno. Não é para ser morno, está certo. A igreja nos cobra 100 % de dedicação, mas infelizmente, no nosso cotidiano, nós temos que lidar mais com as coisas do dia a dia. Isso é a história da humanidade. Nós temos que lutar primeiro pelo que é variável e não pelo que é absoluto. Contudo, penso que todo cristão possui a certeza de que o amor de Deus é absoluto. Assim como o seu amor, o seu julgamento também é absoluto. O julgamento existe, é claro. Julgamento é uma palavra que sugere um fato, mas não é uma palavra final, não a última palavra.

Karl Barth, um dos gigantes da teologia do século XX, afirmava que nós temos que pregar sobre a ira de Deus, assim como pregamos sobre o amor de Deus, porém, deixando bem claro que eles não são do mesmo nível. Nós temos que pregar mostrando que o triunfo do amor sobre a ira é mais do que evidente. A graça de Deus é sempre maior que o nosso pecado. O amor de Deus é o absoluto que tem a palavra final.

O problema existe quando credenciamos as pessoas a esse amor. Como pode o Congresso Nacional praticar esse amor absoluto? Como pode o STF estar imbuído da certeza desse amor? Como pode ser que a liderança do governo se sinta debaixo dessa graça? O cristão quando avalia o amor no relacionamento entre as pessoas deve usar sempre o critério de que o amor exigido por Deus se fundamentar na justiça. Outro grande teólogo do século passado disse o seguinte: No mundo de sistemas como o nosso o discípulo verdadeiro pode repartir o seu amor com os outros somente sendo justo com eles. O amor de Deus nos compele ao que é justo. No mundo de sistemas o cristão tem que cambiar o seu amor pela moeda chamada justiça, desde que esta é a única moeda corrente nesse mundo.

A maioria das pessoas não encontra um absoluto na vida, desde que sai pela manhã até que retorna à noite. Mas o que seria esse absoluto na vida? O que seria um absoluto na sua vida cotidiana? Por exemplo: Que absoluto você usaria para determinar o preço da passagem de ônibus na sua cidade? Você teria um absoluto de amor e justiça para determinar esse preço? Um preço alto serviria para aumentar o lucro dos empresários, até que se tornaria impossível andar de ônibus. Por outro lado, um preço baixo favoreceria os passageiros e causaria a falência da empresa. Olhando por alto, ambas as respostas estariam relativamente certas. Mas precisamos de uma resposta, porque algum peço a passagem deve ter.

A política tem sido descrita como a arte do possível. A política vive com o compromisso do ajuste. O ganho de um grupo é a perda de outro grupo. A política boia nas correntes que tumultuam e espumejam os mares do certo e do errado. Então, o alvo da justiça é balancear esses níveis e é por isso que como cristãos nós temos evitado a atividade política. Nós imaginamos que esse terreno não nos pertence, pois estamos no terreno do absoluto. Nós não nos sentimos em quando temos que assumir algum compromisso que nos leve a algo relativo. Nós estamos amarrados pelos nossos absolutos. Nós cremos que o amor é a resposta certa e imediata para todo o problema e toda a solução. Como membros do corpo de Cristo, a maioria de nós tem fugido da atividade política.

De fato nós achamos que a política é alguma coisa desagradável e até lamentável, mas ficamos satisfeitos quando vemos os oficiais públicos sendo punidos. É tão fácil censurar. Se todo mundo faz isso, porque nós não? Mas como cristãos temos que mudar esse quadro. Eu preciso muito disso. Temos que aprender a agir num mundo que é menos que perfeito. E se nós nos achamos bons demais para isso, simplesmente somos bons demais, e é esse o nosso problema. Nós achamos que a nossa vocação cristã está acima das coisas comuns como os impostos, do desemprego, da corrupção, das guerras, da falta de moradia e da sucatização de saúde. Nós imaginamos que uma pessoa, desde que experimentou a graça de Deus, não tem mais responsabilidade com o mundo. Que pensamento equivocado é esse!

Em Gênesis lemos que Deus colocou o homem no jardim e o mandou cultivar e guardar. O Espírito Santo que nos ilumina no caminho da perfeição cristã é o mesmo Espírito Santo que na manhã da criação deu responsabilidade ao homem. O conhecimento que vem desse Espírito nunca nos guiará ao ódio a esse mundo, pelo contrário. Entre todos os seres humanos ninguém deve ter mais interesse pelo bem desse mundo do que o cristão. Como cristão nós temos que declarar por meio de palavras e atitudes a boa nova do evangelho que afirma que Deus ama incondicionalmente esse mundo. Essa missão não é uma desculpa para fugirmos da responsabilidade para com o mundo, mas uma chamada para entrarmos de corpo e alma na sua história. (continua)

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